20 abril 2010

Ondas de Aficion e Raça...

Às vezes, gosto mais de escrever algum tempo depois do acontecimento. Sem os calores do momento, tantas vezes empolado pelas emoções que podem levar a exageros, à distância de dias e semanas as coisas são aquilo que foram e se forem grandes, maiores se contam, à luz da memória que nos faz, para sempre, ver o que vimos para não mais esquecer...
Foi a 8 de Abril. Campo Pequeno, que há-de ser eternamente a Monumental de Lisboa, monumental das monumentais!
Em "noite de continuidade", como então escrevi no "Correio da Manhã", as emoções em redor dos Forcados Amadores de Lisboa foram contínuas. De tal forma que acho que muitos dos milhares de presentes iam assistindo ás lides a cavalo com o pensamento na pega que viria depois. Como (e quem) iria ser?...
Consumadas as sempre festivas cortesias, onde todos se fazem aplaudir de respeito e esperança, foi logo o tempo de emoções fortes em torno do adeus de um "cabo" - o segundo da História do Grupo, único nessa noite para seis Pégoras de pedir contas...
José Luís Gomes sentiu o respeito da multidão que, de pé, o aplaudiu com entusiasmo. Há palmas e palmas...E aquelas tinham o som das verdadeiras!
Perante a condecoração com a Medalha de Mérito Municipal Grau Ouro da Câmara Municipal de Lisboa, que lhe foi colocada em plena arena pelo Presidente António Costa, a que se seguiu a homenagem prestada pela empresa lisboeta, representada pelo Administrador João Borges, o clima atingiu elevados níveis. Estava ali, não só um adeus, mas toda a consagração de uma carreira a todos os títulos exemplar!
Era também o agradecimento dos gestos toureiros que José Luís Gomes soube ter ao longo dos tempos, com a expressão maior dos seus cites e recuos "templados" na cara dos toiros!
A primeira pega foi a da despedida. E tudo se viu, entre aficion e raça, em ondas de querer, de entusiasmo, de emoção, de valores e gratidão! Recouo diante daquele "Pégoras", que tinha "guaza", isto é, "manha", que parecia o que não era...Mediu, investiu e "humilhou" para atacar a defender-se com derrote forte - valeu o saber, a raça e o querer daquele "cabo", que sabia ao que ia e porque ia...fechou-se de braços e alma!
Depois as voltas, os ombros da nostalgia e serena felicidade daqueles minutos que são tristes de adeus...O gesto final do senhorio fidalgo mas popular, de beijar aquela terra, arena de todas as arenas, que se repitirá ao deixar a Praça, no final.
A segunda pega da noite foi a do novo "cabo", Pedro Maria Gomes. Dura e dificil, para exemplo do que é a vida e do que é ser isso mesmo - "cabo" dos Amadores de Lisboa, em terceira geração! Pega de emoção elevada, com a nota espectacular de não ter sido à primeira, porque houve pensamentos trágicos superados por técnica e valor, individual e de conjunto, houve aficion e raça também!
Gonçalo Maria Gomes "foi-se" ao terceiro da noite, com aquela elegância pujante e vibrante, seu apanágio de tantas tardes e noites. Forte como as fortalezas, sereno como os que sabem e podem, foi épico naquela pega que foi uma das tais...para ver e sentir! Recuar nos limites da perfeição, após cite preciso e fechar-se como quem abraça a vida! Um grande momento naquela noite histórica de Lisboa!
Francisco Mira já habituou os aficionados a pegas com estilo...Um estilo muito pessoal, que segue a linha dos eleitos. Terá bebido da técnica e sentimento de José Luís Gomes, mas confere-lhe o sinal da sua própria e jovem personalidade. Muitissimo bem!
João Lucas sofreu com o quinto. De córnea fechada (a mais para uma corrida com forcados), não lhe foi fácil fechar-se, sendo que as investidas e os derrotes levavam "faíscas"...Acabou por resolver a papeleta, como noutras ocasiões, ele que, com alguns quilitos a mais (...) é dos que não gosta de perder nem a feijões!...
Pedro Miranda fechou a corrida, na também emotiva 6ª pega da noite, que a RTP bem transmitiu. Pega de bom recorte, em pleno, a condizer com técnica e com raça das antigas, que naquele Grupo sempre há que manter!
As ajudas variaram de intérpretes. E até o rabejador. Embora em início de temporada, há ali noções assentes e desempenhos correctos. E quando algo falhou à primeira, bem se notou o cuidado de rectificar logo depois. O que é importante.
Das lides a cavalo, outros já falaram noutros locais também. António Telles e João Salgueiro destacaram-se, cada qual com uma lide superior e de elevada nota. Hérnandez andou variado mas algo disperso, só rematando êxito com os três palmitos finais.
Uma corrida séria, com Pégoras desiguais em tipo e jogo, manseando, duros de génio. Já os vi melhor, embora tivessem tido condições para êxitos maiores por parte de quem os lidou.
Noite de continuidade! Os antigos cada vez mais antigos mas cheios de orgulho, certamente, nos cada vez mais jovens que lhes prosseguem a História! Assim deve ser ! Continuidade em unidade!
Entre salutares ondas de aficion e raça...E também com uma especial classe de sempre!!!
Maurício do Vale

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